domingo, 10 de fevereiro de 2013

A Religião como Cortina de Fumaça - Parte II (exemplo dos efeitos da ação das bancadas religiosas na vida política)



O texto que iniciou essa série discute como as forças políticas e sociais mais reacionárias se utilizam da religião como um disfarce para esconder seus interesses reais para a busca do poder.
Como os disfarces antigos perderam força na pós-modernidade, devido ao discurso politicamente correto, a religião acabou sendo a principal cortina de fumaça usadas pelos partidos e setores mais conservadores contra qualquer força realmente inovadora dentro da sociedade, além de permitir que candidatos com intenções completamente anti-populares vençam as eleições, e, chegando ao poder, coloquem as coloquem em prática.

UM CASO INTERESSANTE

Nessa segunda parte usaremos alguns casos como exemplo. O primeiro caso que me chama a atenção é o do pastor Eurico (PSB-PE), deputado eleito com 185.870 votos.  Pastor Eurico se elegeu a partir do imenso curral eleitoral que é a Assembléia de Deus em Pernambuco e no Brasil; durante a campanha lembro de conversar com o representante da campanha dele na cidade e a ladainha em defesa do candidato era a mesma: “temos que votar nos irmãos de fé”, “vamos votar contra a lei homofobia”, “vamos defender o evangelho na câmara” e por aí vai... Lógico que essas propostas são aceitas pela massa de fiéis das igrejas que, aliados a desinformação geral da população que não sabe como os poderes da república funcionam, vêem seus líderes como verdadeiros “ungidos” e enxergam todos os aspectos da realidade como uma luta de um suposto “bem” contra o “mal” (lógico que para ele o “bem” é tudo que está de acordo com os dogmas religiosos e “mal” é tudo que foge das regras da religião).

A votação de Eurico só mostra a eficiência deste discurso religioso (que inevitavelmente evolui para posicionamentos bizarros) e a incapacidade da grande maioria dos cidadãos em discutir política a partir de propostas e projetos e da rede de interesses que está por trás de cada candidato, partido ou grupo social ao qual esse representa.  Essa incapacidade permite que o candidato tenha um excelente disfarce para seus reais interesses e para as implicações práticas das propostas políticas e sociais destes candidatos.

O mais interessante é que esse mesmo Pastor Eurico votou em favor de um imoral projeto de lei que tenta privatizar os Hospitais Universitários (http://forumsus.blogspot.com.br/2011/09/veja-quem-votou-no-projeto-de-lei.html  Procure na parte “PSB”) . Ou seja, ele, o 5º deputado mais votado em Pernambuco, votou para que os Hospitais Universitários, que atendem gratuitamente o cidadão e ainda servem como residência médica para formandos, sejam privatizados e possam passar a cobrar por um serviço que deveria ser gratuito e direcionado justamente aos mais pobres e necessitados. 

 Porque o Pastor Eurico (ultimo do cartaz não divulga a seus eleitores, especialmente os que fazem parte do curral eleitotal religioso, que ele é a favor da privatização da saúde pública? 
Agora cabe uma reflexão: se o Pastor dissesse  que é favor da privatização de hospitais públicos ele teria uma votação tão expressiva? Acho que nem eleito seria, mas foi simplesmente porque escondeu seu discurso em toda uma retórica religiosa. Mas aí se mostra uma face destas bancadas religiosas no congresso: o ódio a qualquer coisa que seja pública ou que exija um contrapartida social 

O caso do Pastor Eurico é o mais emblemático por diversos motivos: primeiro que é de Pernambuco, meu estado natal ; segundo que é o caso mais evidente do curral eleitoral religioso, também chamado de “voto de cajado”; terceiro porque é a mostra maior do cinismo promovido por essas bancadas religiosas. A estratégia de disfarçar suas posições políticas nefastas atrás de um discurso moralista religioso é a prova desta cortina de fumaça que as forças políticas mais reacionárias usam para disfarçar as reais conseqüências de sua presença nas esferas do poder.

OUTRO CASO BEM ELUCIDATIVO

CNI e evangélicos se unem contra taxação de fortuna e pensão gay



 


Outro fato que mostra de que as bancadas religiosas são um braço importante dos políticos de caráter antipopular foi o caso da votação do projeto de taxação das grandes fortunas, que foi vetado na câmara com fundamental participação da bancada religiosa em aliança com a CNI (Confederação Nacional da Indústria). 

Antes cabe uma reflexão: qual cristão, baseado em sua fé e no conhecimento das palavras de Cristo, se oporia a uma lei que taxasse diferencialmente as grandes fortunas?  Basta uma leitura simples dos evangelhos para ver que as palavras de Cristo quanto aos ricos são duras (por exemplo Mateus cap. 19 ver. 21, ou mesmo as palavras do sermão do monte servem para perceber que Cristo não era lá grande entusiasta das grandes fortunas.)

O projeto que taxa as grandes fortunas foi vetado a partir da ação nefasta desta bancada religiosa, que conseguiu, de uma única tacada, unir o seu tradicional preconceito religioso com a seu tradicional elitismo reacionário. O fato é que a aliança entre os políticos vinculados com as grandes elites e os deputados religiosos conseguiram impedir que dependentes de homossexuais tivessem direito a benefícios previdenciários e impediram um projeto de lei que taxaria os patrimônios acima de 4 milhões de reais, e a arrecadação desse tributo sendo direcionada ´para a saúde pública.

Ou seja, para defender o interesse dos ricos e manter seu preconceito homofóbico, os deputados sacrificaram um projeto de lei que garantiria maiores recursos para a saúde pública e beneficiaria justamente os mais pobres (muitos dos que votaram neles, diga-se).

UMA CONCLUSÃO

É esse tipo de política canalha, elitista, preconceituosa e imoral que é praticada pelas bancadas religiosas. São esses os efeitos da ação da religião sendo usada  como pauta política.
No fim a ação das bancadas religiosas serve para punir o pobre e fazê-lo achar bom, bem ao gosto da direita mais reacionária.
Não há na bancada religiosa do congresso um único projeto relevante nas áreas de saúde, educação e segurança que tenha sido elaborado por seus membros, afinal esse não é o interesse deles.
Ao impedir as minorias sexuais e sociais de terem direitos e fazer grande estardalhaço por isso a bancada religiosa cria um disfarce perfeito para o projeto de poder que vem tentando ser implantado pela direita brasileira: o da precarização dos serviços públicos mais básicos (especialmente os de saúde e de educação).
Citei apenas dois casos que considero principais, mais existem outros casos que podem ser bem elucidativos quanto a ação nefasta das bancadas religiosas no poder.

Em breve a terceira e última parte desta série.

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