terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

CRISE NA IGREJA CATÓLICA E AS QUESTÕES SOCIAIS



NOTA: Aviso de antemão que minha opinião é a opinião de um leigo, nesse texto passo apenas minha percepção sobre a suposta crise do catolicismo nas Américas e Europa. Não encarem como um tratado baseado em extensas pesquisas e leituras, pois não é. Se não gostarem da minha opinião comentem rebatendo e instigando um debate.

CRISE NA IGREJA CATÓLICA E AS QUESTÕES SOCIAIS


Perdoem-me o determinismo marxista, mas uma coisa é fato: religiões prosperam e se sustentam enquanto sejam um braço ideológico das elites dominantes, e só. O enraizamento  das crenças religiosas estão ligadas a outros fatores muito mais políticos, sociais e econômicos e não apenas pelo poder de persuasão de suas doutrinas. Na verdade a religião serve como um bom justificador das regras sociais e da diferença de classes. Historicamente quando uma religião se choca com interesses das classes políticas e econômicas dominantes o destino é, quase inevitavelmente, um processo de decadência e perda de influência. Assim foi com a própria Igreja Católica, que ao se tornar entrave ao nascente capitalismo fez com que parte substancial das monarquias e da burguesia européia fosse entusiasta de um novo credo: o protestantismo (que desde o século XVI,época de sua fundação, vem sendo o algoz do catolicismo). Ao desafiar o centralismo dos reis e a força econômica da burguesia a Igreja Católica começou a tomar uns golpes bem pesados.
De lá pra cá a Igreja só perdeu espaço, as sociedades tornaram-se mais laicas, os países católicos capengaram tecnologicamente e a Igreja perdeu fiéis, muitos fiéis. De nada adiantou a Igreja tentar unir o ocidente em sua figura contra o comunismo, de nada adiantou a aliança com as ditaduras militares nas Américas, de nada serviram as TFPs, de nada adiantou a conivência com os regimes fascistas. O fato é que a Igreja Católica vem passando por um processo de perda de poder; um processo que é longo, em respeito a sua grandeza, mas que justamente por isso permite que se faça uma leitura “in loco” deste fenômeno.

É bom deixar claro que a crise da Igreja não se deve aos casos de pedofilia, estes são apenas reflexos da crise que passa a “barca de Pedro”, a questão é bem maior. Se escândalos determinassem por si só a decadência de uma instituição o PT jamais venceria eleições, a Universal não teria um único fiel e a FIFA não existiria mais.

O fato é que a crise da Igreja se torna mais evidente pelo fato de que com a vitória, talvez definitiva, do capitalismo liberal sobre a utopia socialista as elites que se apegavam a Igreja Católica como forma de manter o próprio poder e a coesão social simplesmente passaram a desprezar o poder do Vaticano. No mundo capitalista não há espaço para o comedimento econômico defendido pelos Papas, a lógica do capitalismo é o utilitarismo extremo e isso em todos os campos: nas leis, nas políticas públicas, nas formas de governo, nos planos econômicos, etc., tudo é pensado em garantir mais lucro, competição e em aumentar o abismo econômico entre as classes sociais e entre as nações.

Assim alguns dogmas de fé da Igreja tornam-se obsoletos para o mercado e são considerado um entrave para o sistema capitalista e para o clima de liberdade individual que se implantou no mundo ocidental.  Daí a dinâmica é simples: A Igreja é contra o aborto e a contracepção, mas as grandes nações querem famílias pequenas para gastarem menos com saúde e educação públicas; a Igreja quer limites para a pesquisa científica, o mercado quer que certas pesquisas sejam potencializadas (podem ser lucrativas para a indústria farmacêutica e alimentícia); a Igreja quer comedimento sexual dos mais jovens, o mercado lucra com a sexualidade; a Igreja defende o casamento tradicional, hoje o grupo social que valoriza o casamento são justamente os que são proibidos de casar: os gays.

É esse descompasso que faz com que a Igreja Católica tenha perdido poder nesses anos todos, os escândalos de pedofilia do clero são potencializados porque além de gerarem polêmica e audiência, pela importância milenar do catolicismo, nenhum meio de comunicação mantém laços financeiros relevantes com a Igreja Católica (mídia e jornalismo funcionam mediante dinheiro, ora bolas!)
Casos de escândalos financeiros e sexuais acontecem em todos os credos, afinal líderes religiosos também são pessoas normais e que, vez por outra, dão suas escorregadas. Mas é interessante pensar que, ao menos no Brasil, casos de escândalo sexual entre membros de religiões protestantes e afro-brasileiras é semelhante ao número de casos entre clérigos católicos (basta uma busca no Google pra saber, ou acessar o www.paulopes.com) mas a mídia repercute grandemente os casos que envolvam padres e bispos da Igreja de Roma. A resposta é simples: a Igreja Católica se recusa a dialogar com meios de comunicação privados e seculares, é como se pensasse que todos lhe devem reverência por sua importância histórica, mas a mídia pouco se importa com a História, importa-se com lucro. A Igreja Católica no Brasil resolveu divulgar suas doutrinas e sua visão dos fatos através de redes de TV próprias (Rede Vida, Canção Nova) e todas são retumbantes fracassos de audiência. Enquanto isso as Igrejas Protestantes praticamente garantem o lucro das grandes redes de TV (exceção da Globo) com a compra de horários de TV para pregação.  Assim as redes de TV, menos a Globo, não se interessam em noticiar os escândalos dentro de igrejas evangélicas com a mesma ênfase com que noticia os escândalos da Igreja Católica (já imaginaram quanta grana investem RR Soares, Malafaia e Valdomiro em programas de TV?).

A mídia é impiedosa com aqueles que não a sustentam...

A PUNIÇÃO
Quando se olha algumas das recentes decisões da Igreja fica difícil pensar em uma saída para a crise do catolicismo. A Igreja defende elites que não mais se importam com ela e tomou decisões teológicas e políticas (é sempre bom lembrar que o Vaticano é um Estado) que a afastou das grandes massas populacionais formada pelos mais humildes. O caso da condenação da Teologia da Libertação pela “Congregação para Doutrina da Fé” hoje se reflete na distância que as classes mais humildes alimentam com a Igreja

Talvez um dos movimentos mais interessantes dentro da Igreja Católica nos últimos 50 anos tenha sido a Teologia da Libertação. Muito famosa na América do Sul e Central, a TL pregava uma visão mais social-crítica das palavras de Cristo, defendia que o católico não deveria se prender apenas ao lado metafísico da vida espiritual, mas usar os princípios cristãos, aliados a conhecimentos sociológicos e políticos, para tomar partidos dos mais pobres e oprimidos (como, talvez,  Jesus faria). Assim a Igreja deveria tomar partido em favor dos movimentos sociais por terra, moradia, alimentação e democracia, deveria ser uma força social que lutaria por mudanças sociais positivas para os mais pobres.

Lógico que a tradição elitista da Igreja Católica, bem como o conservadorismo político de João Paulo II (ele uma vítima da ditadura socialista na Polônia), acabou se refletindo na condenação do movimento político-teológico e com a excomunhão de vários de seus líderes, entre eles Leonardo Boff (hoje um “popstar” do pensamento de esquerda). Outros, como Frei Betto, não foram excomungados mas saíram da linha de frente da Igreja no Brasil que mergulhou num profundo conservadorismo (vide as posições da CNBB nos últimos anos sobre alguns temas políticos e ao fato de Frei Betto hoje ser mais considerado mais um “padre petista” do que um “padre católico”).

Assim diante das crises sociais que se seguiram a Igreja ficou do lado dos dominadores que a desprezam, não dos rebelados que lutavam por direitos ou mudanças sociais. A Igreja acompanhou o processo de criminalização dos movimentos sociais promovido nos anos 80 e 90 promovidos pelos grandes países capitalistas e que depois foi exportado para os países pobres, especialmente das Américas do Sul e Central. A condenação da Teologia da Libertação afastou a Igreja dos movimentos sociais e das massas excluídas e a transformou num peso morto nas questões políticas.


Hoje a Europa que passa por profundas crises sociais é o mesmo continente onde as paróquias fecham por falta de fiéis; onde toda uma juventude preocupada por seu futuro, devido a precarização das condições de segurança social no continente, protesta e sai as ruas contra toda uma estrutura de poder e a Igreja em nada pode fazer em favor deles, pois escolheu o lado errado pra apoiar. Esses jovens simplesmente não enxergam  a Igreja como aliada nas suas lutas. Ao condenar movimentos que usavam o cristianismo como forma de questionamento social a Igreja Católica afastou os jovens politizados e perdeu a chance de ser um moderador que poderia conter a fúria que hoje varre as ruas da Europa.

A falta de coragem em tomar partido em favor dos mais fracos, como Cristo faria (eu acho), fez a Igreja perder  contato com aqueles que vivem a realidade na prática.

SOBRE A RENÚNCIA DE BENTO XVI
O irônico é que a crise entre a Igreja e a sociedade, que hoje explodiu nas mãos de Bento XVI, tenha um pouco de culpa do próprio Ratzinger. Ele mesmo comandou o processo de condenação da Teologia da Libertação em 1984 e 1986, e hoje se diz fragilizado em sua saúde para cuidar da Igreja frente aos “enormes desafios de um mundo em transformação”. 

Talvez fosse mais fácil, mas não dá pra consertar certas coisas do passado.

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