O humorista americano Bill Maher costuma dizer que nessa
autodenominada “era da informação” a coisa mais difícil é encontrar uma
informação verdadeira. Ele está certo. Nesse mundo das redes sociais ficou
ainda mais difícil ter acesso a informações realmente sérias.
As redes sociais tornaram-se a prova de que as pessoas
vivem em verdadeiros “cercadinhos mentais” e que não estão dispostas a sair
deles. Não adianta que a escola ensine a duvidar de tudo (o que infelizmente
poucas fazem, diga-se), ou que tenha um consenso social de que todos devem ter
direito a livre-expressão e que se deve sempre ouvir atentamente os vários
lados de uma história. O fato é que nessa era da informação as pessoas não
estão somente interessadas em interpretar um personagem nas redes sociais
(geralmente todo mundo se pinta de engajado, espiritualizado, defensor dos
animais, da ética na política, fiel a Jesus, etc.). Mais do que isso elas
estão interessadas em aderir previamente, e sem muita reflexão, a ideologias
que melhor lhes agrade, que esteja de acordo com uma visão arbitrária, binária
e infantil de mundo que vem herdada da mania que a sociedade tem de buscar estereótipos
simples para dar respostas igualmente simples para tudo.
Lógico que para cada tema complexo as respostas simples se
mostrarão verdadeiras furadas e, creio eu, todos que propagam idéias simplórias,
mas com pretensão de “resposta absoluta”, sabem em seu íntimo que estão a
divulgar uma notória falsidade. Mas a lógica do mundo virtual, assim como do
mundo real, não é a de questionar as coisas, é a de aderir a elas e uma vez que
se confesse como adepto de alguma idéia passar a defendê-la de maneira doentia,
irracional e quase psicótica.
Essa semana explodiu uma série de postagens no facebook
contra o Deputado Federal Jean Wyllys, onde se atribuía a ele uma série de
frases de altíssimo preconceito contra os cristãos. A função clara do movimento
era esvaziar o discurso do deputado fazendo sua defesa dos direitos dos
homossexuais ser confundida com um forte anti-cristianismo digno do ateu mais
ranzinza e infantil.
Esse movimento tem a ver com acontecimentos que se deram nos
últimos dois meses em que a vitória das forças teocratas do Brasil vieram
acompanhadas de uma forte reação de pessoas com credibilidade nos campos das
ciências, artes e política. Isso expôs ao ridículo o discurso de algumas
figuras proeminentes do fundamentalismo religioso brasileiro tais como Silas
Malafaia e Marco Feliciano.
No caso do Malafaia ele foi literalmente desmascarado pelo vídeo-resposta
do geneticista Eli Vieira sobre suas afirmações no programa “De Frente com Gabi”
no SBT. Malafaia fez vários outros vídeos respondendo a Elí, (“respondendo” é
modo de falar, o termo mais certo seria “insultando”, “atacando”). Mas para dar
uma verdadeira pá de cal nas mentiras do Malafaia a Sociedade Brasileira de
Psicologia e a Sociedade Brasileira de Genética deram razão a Elí Vieira em
notas oficiais. (Veja aqui e aqui)
Eli Vieira desmonta as falácias ditas por Malafaia no programa "De Frente com Gabi" do SBT.
As reações destemperadas do pastor em relação ao vídeo não surtiram efeito.
Nos dias seguintes a Associação Brasileira de Psicologia e Associação Brasileira de Genética manifestaram endosso as aformações de Eli Vieira.
Depois a eleição de Marco Feliciano para presidência da
Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. Esse fato, culpa da
irresponsabilidade do PT com uma de suas bandeiras históricas, desencadeou
revoltas entre os movimentos negros e homossexuais devido a afirmação de
caráter racista e homofóbico de Marco Feliciano. A revolta saiu do “sofátivismo”
e tomou ruas, com protestos em várias cidades.
As vigarices do Feliciano pipocaram na internet, reportagens demolidoras de jornalões e revistas semanais importantes mostraram o desastre
que representa Feliciano presidindo uma comissão de direitos humanos.
Daí começa a jogada da campanha difamatória pela internet,
como forma de criar uma cortina de fumaça sobre a realidade destes fatos.
Quem deu início a essa campanha foi o Pastor Malafaia ao ressuscitar
uma menção mentirosa a Jean Wyllys, informando que em entrevista concedida ao
Jornal do Brasil ele teria feitos sérios insultos aos cristãos. (na imagem
abaixo)
Malafaia ressuscita factóide criado por ele próprio contra Jean Wyllys. Link da postagem direciona para site gospel tendencioso ao Malafaia, não existe a referida Matéria do Jornal do Brasil em edição impressa (como afirma Malafaia no primeiro tweet da imagem). O Jornal do Brasil deixou de circular em 2010 de forma impressa, Jean Wyllys concedeu entrevista ao Jornal já em 2011
O fato é que Malafaia pode ser facilmente descoberto em
sua mentira a partir de suas próprias palavras, afirma que a entrevista,
concedida em 2011, não estaria no site do Jornal do Brasil mas si na sua edição
impressa. O fato é que o Jornal do
Brasil parou de circular em sua versão impressa em 2010. O link postado
pelo Pastor Silas Malafaia direcionava a um site religioso de caráter
nitidamente tendencioso (e nesse caso, mentiroso).
Foi o suficiente para que os reaças de todos os credos passassem
a divulgar a imagem do Jean Wyllys junto com a falas falsas da falsa entrevista.
E isso se proliferou na internet de forma impressionante, mesmo com as
postagens não contendo nenhum link para a postagem original (afinal ela não
existe). Nesse sábado a acessoria do Jean Wyllys divulgou nota falando o
qualquer pessoa com a mínima noção das coisas já sabia: as falas eram falsas e
descabidas.
POR QUE AS PESSOAS PROPAGARAM ISSO?
Imagem com afirmações falsas atribuidas a Jean Wyllys. Divulgada a exaustão por perfís supostamente religiosos no facebook
Sinceramente não me causa espanto que os admiradores do
Malafaia tenham espalhado uma notória mentira sem o menor complexo de culpa.
A resposta disso NÃO está propriamente
na religião ou religiosidade, por dois motivos: 1- alguém por ser
evangélico não significa que necessariamente seja homofóbico ; 2- O
Malafaia tem admiradores em todos os credos e até entre ateus (pasmem!!!), mas
não é essa unanimidade entre os evangélicos que todos acham.
A questão vai além da religiosidade, muito além.
Acho que as pessoas encontraram em personalidades como Silas
Malafaia, Marco Feliciano e Jair Bolsonaro (para não ficar apenas na questão
religiosa) figuras que servem como legitimadores do preconceito que já carregavam
intimamente. Daí a notoriedade dessas figuras passa a ser um encorajador
para que toda a corja de homofóbicos, racistas e anti-ateistas e etc. saiam do
armário e sintam-se a vontade em declarar seus preconceitos. Para fugir da
patrulha social eles alegam estar “exercendo o direito a livre-expressão”, como
se insultar um grupo social fosse um direito.
Hoje o radicalismo conservador perdeu totalmente e vergonha
e não mede palavras contra aqueles a quem consideram uma ameaça. Daí alguém
dizer que se deve “cair de pau nos gays”, ou que “a Aids é o câncer gay” ou
ainda que os “africanos são amaldiçoados” são tidos como liberdade de expressão
religiosa.
Esse tipo de cidadão não quer discutir pela razão, quer
impor sua força apenas porque é maioria na sociedade. Não importa que a
cada dia se prove que as falácias pseudo-científicas divulgadas por pessoas
como Silas Malafaia, Marco Feliciano, Marisa Lobo são completas inverdades, não
importa que não exista nenhuma razão plausível para proibir o direito das
minorias, não imposta que esteja nítida a aliança entre a bancada religiosa no
congresso e as forças políticas mais atrasadas do Brasil. Essas pessoas
querem é impor a ideologia que carregam em seu “cercadinho mental”, aquela que
eles adotaram apenas porque lhes era agradável e não por terem refletido de
verdade sobre ela.
A prova disso tirei em dois debates que travei no facebook. Nos
dois casos chega a ser engraçado a semelhança nas respostas e como elas são
sintomáticas daquilo que acabei de descrever no parágrafo acima: “e daí se ele
estiver mentindo, isso é problema dele. Isso é incômodo/inveja sua.”
Ou seja: ele pode mentir livremente desde que minta em
favor do meu preconceito.
É preciso ser justo que em um dos casos a pessoa, uma
mulher, reconheceu o exagero em sua fala e me pediu desculpas (prontamente
aceitas, além do mais conheço a pessoa e sei que ela não é chegada em mentiras),
mas ainda sim insistiu em alfinetar que meu ranço era com os evangélicos em
geral e não com os Malafaias e Felicianos da vida.
OS FINS JUSTIFICAM OS MEIOS (E OS MEIOS DESMASCARAM AS REAIS
INTENÇÕES)
Quando vejo fenômenos como esse acontecido essa semana penso
que a questão não é de convicção religiosa, ainda que fosse não daria maior credibilidade
a questão. A crença religiosa está sendo usada para camuflar as reais
motivações dos asseclas das figuras que citei no texto acima. A religião
sempre serviu como uma eficiente cortina de fumaça sobre os temas mais
espinhosos e sobre as intenções mais escusas(o que já denunciamos neste blog
aqui e aqui ), daí não me espante que
estes grupos ditos “religiosos” tenham coragem de mentir sobre um tema.
Simplesmente porque suas motivações não são religiosas, são puramente
homofóbicas, racistas, elitistas, a crença religiosa serviu apenas de embuste
para que estas idéias pudessem ser faladas livremente.
Fico pensando se Jesus Cristo, caso voltasse a Terra, alimentaria
um ódio tão radical contra gays, africanos, ateus, espíritas, entre outros. Será ele aceitaria mentir para difamar um opositor?
Com certeza não, mil
vezes não!
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ResponderExcluirParabéns pelo post!
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